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segunda-feira, outubro 15, 2012

A invenção da roda


Uma crônica do poeta, publicitário e ex-diretor do IEL-RS, Ricardo Silvestrin, falando dos anos heróicos da poesia aqui em Porto Alegre.

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           Então resolvemos criar o PAPO, o Partido dos Poetas. Isso foi lá por oitenta e poucos. Era ano de eleição. Chamamos vários poetas para uma reunião. Decidimos que o PAPO iria ser lançado na Feira do Livro de Porto Alegre. O lançamento seria uma série de aviõezinhos de papel com poemas impressos, lançados ao ar num recital. O recital, por sugestão do Mario Pirata, teve uma forma de roda. Ele trouxe também uma canção do poeta Oliveira Silveira: "poesia na roda, eh / quem chegou é bem chegado / umbigada em você / para dar o seu recado".

           Depois desse dia, durante uns quatro anos seguidos, eu, Mario, Alexandre Brito, João Angelo Salvadori, Ricardo Portugal, Pablo Melo, Caio Gomes, Pedro Marodin, Brizola, Ricardo Mainieri e tantos outros, afinal, quem chegasse era bem chegado, fizemos a Roda de Poesia, das onze da manhã até a uma da tarde, todo domingo, no Brique da Redenção. A gente só parava porque cansava, pois as pessoas continuavam ali, embaixo do sol, ouvindo poesia. No meio da roda, um dos bordões do PAPO: "não precisamos de verbas / pois já temos os verbos".

           Acabei de ler o livro Belvedere, do poeta carioca Chacal. Reúne toda a sua produção poética numa bonita edição da CosacNaify. Chacal tem muito a ver com o espírito disso tudo que coloquei acima. Seu primeiro livro é de 1971. Editou em mimeógrafo. Vendeu e distribuiu na entrada de cinemas e teatros. A sua gíria de poeta chamou a atenção de Waly Salomão, Hélio Oiticica e Torquato Neto. Uma nova linguagem para uma nova visão de mundo. Um poeta da contracultura, do rock, com referências de Stones, Hendrix, Caetano, mas também de Manuel Bandeira, de Oswald de Andrade. O segundo livro dele se chamou O Preço da Passagem. Tinha esse nome porque queria juntar uma grana para viajar até Londres. Conseguiu.

           As edições dessa geração, comercializadas em bares e nos eventos culturais, chegavam a quatro mil livros vendidos. Em Londres, Chacal viu e ouviu a poesia falada de Allen Ginsberg, o poeta beatnik. Na volta, fundou com amigos o grupo Nuvem Cigana, que soltou o verbo em diversos recitais pelo Rio de Janeiro. 

 

          Numa recente entrevista e mesmo num dos poemas do livro, o poeta disse que sempre lhe interessou mais a poesia no corpo do que no livro. O corpo como suporte para o texto. Ou seja, o poeta falando seu poema para os outros, sendo ele o próprio veículo. Semelhante ao músico, ao vocalista, à banda de rock. O cara chega e faz o show. O CD ou o livro servem para registrar a produção. Mas não se bastam sozinhos. Encontrei o Chacal na última Feira, aqui em Porto Alegre. Ele disse que está achando legal ver a sua poesia toda num livro que pára em pé. Está percorrendo o Brasil e fazendo vários lançamentos. Também está falando com livreiros para ensinar a eles o que dizer na hora da venda. Informa que faz parte de uma geração chamada de poesia marginal e o que isso significa. Fala também com os professores para orientá-los da mesma forma. Agora, Chacal que botar a poesia também numa outra roda. Tomara que consiga.

 

Ricardo Silvestrin

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