Uma crônica do poeta, publicitário e ex-diretor do IEL-RS, Ricardo
Silvestrin, falando dos anos heróicos da poesia aqui em Porto Alegre.
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Então
resolvemos criar o PAPO, o Partido dos Poetas. Isso foi lá por oitenta e
poucos. Era ano de eleição. Chamamos vários poetas para uma reunião. Decidimos
que o PAPO iria ser lançado na Feira do Livro de Porto Alegre. O lançamento
seria uma série de aviõezinhos de papel com poemas impressos, lançados ao ar
num recital. O recital, por sugestão do Mario Pirata, teve uma forma de roda.
Ele trouxe também uma canção do poeta Oliveira Silveira: "poesia na roda,
eh / quem chegou é bem chegado / umbigada em você / para dar o seu
recado".
Depois desse dia, durante uns quatro anos seguidos, eu, Mario, Alexandre
Brito, João Angelo Salvadori, Ricardo Portugal, Pablo Melo, Caio
Gomes, Pedro Marodin, Brizola, Ricardo Mainieri e tantos outros, afinal, quem
chegasse era bem chegado, fizemos a Roda de Poesia, das onze da manhã até a uma
da tarde, todo domingo, no Brique da Redenção. A gente só parava porque
cansava, pois as pessoas continuavam ali, embaixo do sol, ouvindo poesia. No
meio da roda, um dos bordões do PAPO: "não precisamos de verbas / pois já temos
os verbos".
Acabei de ler o livro Belvedere, do poeta carioca Chacal. Reúne toda a sua
produção poética numa bonita edição da CosacNaify. Chacal tem muito a ver com o
espírito disso tudo que coloquei acima. Seu primeiro livro é de 1971. Editou em
mimeógrafo. Vendeu e distribuiu na entrada de cinemas e teatros. A sua gíria de
poeta chamou a atenção de Waly Salomão, Hélio Oiticica e Torquato Neto. Uma
nova linguagem para uma nova visão de mundo. Um poeta da contracultura, do
rock, com referências de Stones, Hendrix, Caetano, mas também de Manuel
Bandeira, de Oswald de Andrade. O segundo livro dele se chamou O Preço da
Passagem. Tinha esse nome porque queria juntar uma grana para viajar até
Londres. Conseguiu.
As edições dessa geração, comercializadas em bares e nos eventos culturais,
chegavam a quatro mil livros vendidos. Em Londres, Chacal viu e ouviu a poesia
falada de Allen Ginsberg, o poeta beatnik. Na volta, fundou com amigos o grupo
Nuvem Cigana, que soltou o verbo em diversos recitais pelo Rio de Janeiro.
Numa
recente entrevista e mesmo num dos poemas do livro, o poeta disse que sempre
lhe interessou mais a poesia no corpo do que no livro. O corpo como suporte
para o texto. Ou seja, o poeta falando seu poema para os outros, sendo ele o
próprio veículo. Semelhante ao músico, ao vocalista, à banda de rock. O cara
chega e faz o show. O CD ou o livro servem para registrar a produção. Mas não
se bastam sozinhos. Encontrei o Chacal na última Feira, aqui em Porto Alegre.
Ele disse que está achando legal ver a sua poesia toda num livro que pára em
pé. Está percorrendo o Brasil e fazendo vários lançamentos. Também está falando
com livreiros para ensinar a eles o que dizer na hora da venda. Informa que faz
parte de uma geração chamada de poesia marginal e o que isso significa. Fala
também com os professores para orientá-los da mesma forma. Agora, Chacal que
botar a poesia também numa outra roda. Tomara que consiga.
Ricardo
Silvestrin
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